Antes de todas as coisas, no início, era o Caos infinito.
A Teogonia é o principal épico que conta a origem do universo e dos deuses na mitologia grega e sua autoria tradicional é atribuída ao pastor Hesíodo, o qual teria também composto Os trabalhos e os dias.
Similar aos hinos homéricos, a Teogonia pertence ao gênero de hino invocatório a Zeus e às musas. Esses hinos abriam as recitações poéticas dos rapsodos. Este épico é uma síntese de uma variedade de tradições gregas sobre os deuses e o universo.

Sua versão vertida à escrita remonta dos meados do século VIII a.C., época quando a escrita alfabética chegou à Grécia. Até então, esses mitos eram estórias orais cantadas por rapsodos. Não sem motivo, o poema inicia-se com um hino às Musas, as nove deusas que inspiram o poeta, as quais são filhas de Mnemosine (a Memória) e Zeus.
O poema narrativo trata de uma cosmologia (descrição do universo) com uma cosmogonia — a criação do mundo organizado (cosmos) a partir do Caos — e a origem dos deuses. A força motriz organizadora do cosmos é o Eros (Amor ou Desejo). Retrata o mito de sucessão. Por esse mito, o deus Cronos derrubou Urano. Por sua vez, Zeus derrubou Cronos e os Titãs. Assim, Zeus tornou-se o governante final do cosmos e pai de uma geração de deuses e heróis. Esse motivo literário da guerra nos céus é chamado de teomaquia (guerra dos deuses) e de titanomaquia (guerra de deuses contra os titãs).
Na visão de mundo dos gregos da Idade do Ferro, a Terra é a terra é um disco plano e circular com montanhas tocando a abóboda rígida do Céu. O Oceano envolve a Terra. Abaixo está o submundo, o lugar dos mortos — inicialmente o Tártaro, depois domínio de Hades.
tigela do céu; a terra é cercada por oceano, e abaixo está o submundo, o
Terra dos mortos.
Esboço estruturado
Proêmio
1-35 Invocação das Musas.
36-115 Musas anunciam que inspirarão Hesíodo a cantar as gêneses
Divindades primordiais
116-125 Caos ou o Abismo. Criação de Gaia (Terra), Tártaro (o Inferno) e Eros (Desejo ou Amor).
125-131 Caos dá à luz Nyx (Noite) e Erebos (Escuridão); Gaia dá à luz Orea (Montanhas), Urano (Céu) e Pontos (Mar) por partenogênese.
132-139 Com Urano, Gaia concebe os doze Titãs: Oceano, Céos, Crio, Hiperião, Jápeto, Teia, Reia, Têmis, Mnemosine, Febe, Tétis e Cronos.
140-153 Novamente com Urano, Gaia concebe os três Ciclopes e os três gigantes Hecatônquiros (“os de cem mãos” ou centimanos).
154-206 Castração de Urano por Cronos. Criação de Afrodite (uma deusa olímpica). Gaia se ressente de Urano por não permitir que ela desse à luz. Com uma foice feita por Gaia, seu filho Cronos corta a genitália de seu pai e os joga no mar. Isso produz espíritos de violência e amor. Do sangue fálico derramado na Terra surge uma raça de gigantes e as Fúrias, espíritos femininos de vingança. O falo, misturado com sêmen e espuma, se transforma em Afrodite no mar.
207-232 Genealogia de Nyx: várias permutações de morte, sono e pecado/mal.
233-336 Genealogias das divindades marítimas menores Nereu, Taumo, Forquis, Ceto e Euríbia; além de vários monstros.
Genealogias de Titãs
337-374 Os titãs Oceano e Tétis geram mais de 6.000 rios e nascentes.
375-403 Genealogias de Crio e Euríbia e seus descendentes.
404-452 Genealogias de Febe e Céos e seus descendentes.
453-458 Cronos e Reia dão à luz aos deuses olímpicos Héstia, Hera, Deméter, Hades, Poseidon e Zeus.
459-506 Cronos engole todos os seus filhos, exceto Zeus, pois fora enganado. Zeus se prepara para derrubar Cronos.
507-616 Genealogia de Jápeto. Os mitos de Prometeu e Pandora.
A ascensão de Zeus
617-663 Zeus alia-se aos Hecatônquiros e passa a habitar no Monte Olimpo.
664-719 Zeus e os Hecatônquiros derrotam os Titãs; Zeus lança os Titãs no Tártaro.
720-819 Descrição do novo lar dos Titãs no Tártaro.
820-840 Gaia, irritada com o tratamento de Zeus com os Titãs, concebe com Tártaro Tifão.
841-868 Com muita dificuldade, Zeus derrota Tifão e o tranca no Tártaro.
869-880 Descrição de Tifão preso no Tártaro.
Genealogias de Zeus e dos deuses olímpicos
881-885 Zeus divide o Universo entre ele mesmo (céu), Poseidon (mar) e Hades (mundo infernal).
886-911 Zeus dorme com Metis, Tétis e outros das Titã. Entre elas estão as morias e as musas.
912-929 Zeus concebe os deuses Apolo, Ártemis, Ares e Atenas. A ciumenta Hera concebe Hefesto.
930-962 Zeus gera os olímpicos Hermes e Dionísio, bem como o herói Hércules.
Mortais e Imortais
963-968 Hesíodo reinvoca as musas e relata sobre deusas dormindo com homens mortais.
969-1018 Descendência imortal de deusas e homens mortais, com vários heróis homéricos como Eneias, Aquiles e Odisseu — e figuras trágicas Polidoro, Éson e Medeia.
1019-1022 Conclusão e um Catálogo de Mulheres.
Paralelos literários
Com a literatura bíblica a Teogonia apresenta vários elementos comuns. A História Primeva (Gn 1-11) e a Teogonia retratam a criação do cosmo, o declínio humano, o distanciamento divino do mundo, genealogias, descentes de filhos de homens e divinos. A literatura apocalíptica (Isaías, Daniel, Ezequiel e Apocalipse) também compartilha vários elementos. O coro celestial cantando incessantemente louvores à divindade celestial que era, é e há de vir (Teogonia 39, Ap 11:17), a grávida que foge porque querem devorar seu filho, a criança que no futuro governará de tudo indicam um repertório cultural comum.
Este repertório cultural comum no Antigo Oriente Médio atinge outros povos. A obra hitita O reinado nos Céus retrata uma teogonia e teomaquia de Kumarbi e Teshub na batalha entre deidades terrestres-celestiais e oceânicas. Mesmo entre os gregos várias versões desses mitos circulavam, como a teogonia órfica.
A Teogonia de Hesíodo inspiraria o escritor romano Ovídio (43 a.C .- 17 d.C.) em suas Metamorfoses e inúmeras obras literárias, musicais e plásticas.
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