A etimologia das cores é um grande revelador da história de uma língua. Essa classe semântica, uma das mais básicas, registra transformações, trocas entre povos e muitas viagens. Adicionalmente, o mesmo objeto – o espectro das cores – possuem vários modos de ser divididos, conforme a percepção da comunidade cultural e até mesmo individual. Com base nos nomes em português, vemos como as cores tiveram essas fascinantes trajetórias.

Laranja
O nome vem da fruta cítrica. Resultante do cruzamento do pomelo ou cimboa (Citrus maxima) com a tangerina (Citrus reticulata) em algum lugar do norte da Índia. O nome em sânscrito era naranga, depois os persas desenvolveram a citricultura (chamada de narang) e os árabes a introduziram a naranj na Espanha no século 11 com o nome naranja. No entanto, as cepas europeias (também era cultivado na Sicília, com o nome arancia, de onde vem o salgado de arroz frito ancestral da coxinha) eram amargas ou extremamente azedas. Mas ficou o nome latino Citrus aurantius.
Na grande aventura das navegações portuguesas, outra variedade, mais doce, foi introduzida na Europa no século XVI. Em algumas línguas e dialetos do sul da Itália, a fruta é recebe a designação de portogallo ou portuallo, e ainda em albanês portokall, búlgaro portokal, burtuqal em árabe e portokali em grego (nessa língua a antiga variedade ainda é chamada nerantzi). Junto da nova variedade, veio o nome da cor terciária, formada pelo vermelho e o amarelo.
É difícil explicar o motivo de o português adicionar o la-. Talvez por influência do artigo al- do árabe. Mas já escutei que veio de l’orange, do francês ou do provençal, em razão da cidade homônima. Não me parece plausível. O nome da cidade no Languedoc e da casa real de Orange historicamente ligada aos Países-Baixos (e ao uniforme do time de futebol neerlandês) vem do antigo provençal Aurenja, que por sua vez era o nome latino do deus gaulês das águas, Arausio.
Vermelho
Ao verme que primeiro roeu em latim vulgar *vermiclus, do latino vermiculus (pequeno verme) veio o nome dessa cor. Um pequeno inseto Coccus ilicis comum no Mediterrâneo era a fonte da tintura dessa cor. Outra fonte dessa cor era o molusco haustellum, um gênero de caracóis marinhos, dando nome ao povo fenício (do grego phoînix), o púpura de Tiro. O Coccus, Kermes vermilio, deu nome ao carmesim ou o carmim (lat. cremesinus > carmes). O coccus latino não foi popular, dando espaço ao escarlate, do latim tardio scarlatum, derivado do persa saqirlāt. Com a descoberta da cochonilha mexicana, o kemis foi substituído. A tintura chamada vermelhão também existe em outras línguas européias, mas diferente de suas linguas irmãs latinas, o português não usa derivado dos latinos russus, rosa ou rubeus para o nome dessa cor. Ainda do latim vieram outros termos avermelhados: ruivo vem rubeus, que vem do proto-indoeuropeu *reudh-.
Azul
A cor vem da pedra lápis-lazúli ou lazulita, explorada desde o neolítico em Mehrgarh, vale do Indo, no norte do atual Paquistão. O pó moído servia de pigmentos para tintas, mas era raro, tanto que muitas línguas da Antiguidade não tinham um nome específico para essa cor (uma exceção eram os exibidos egípcios). Marco Polo (As Viagens 1.29) menciona um lugar na Ásia Central com o nome Lajward, onde era minerado a pedra. Do sânscrito rajavarta (riso do rei) teria vindo o persa lajavard, transmitido ao árabe lazuward, do qual veio o termo latino medieval lapis lazuli.
No espectro padronizado nas culturas ocidentais (vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil e violeta) há distinção entre azul e anil. Esse tom mais escuro também tem origem e trajetória da Índia (nīlā), Pérsia (nil), mundo árabe (annir) até chegar ao anil português. O anil (a planta) também é chamada de índigo, do latim indicum, e refere-se à Indigofera tinctoria planta encontrada na China, Sudeste Asiátio, Egito, Índia e Peru.
Branco
Vem de *blank, branco, brilhante, oriundo das antigas línguas germânicas que no final do Império Romano se enraizaram na Europa Ocidental.
Amarelo
Há duas possíveis etimologias para essa cor. Uma delas, postula que vem do árabe anbari, cor de âmbar. Tanto a pedra de resina fossilizada quanto a secreção das tripas da baleia eram chamadas de anbari.
Outra possibilidade é sua origem latina, amarellus, diminutivo de amarus, que por sua vez tem raízes remotas no proto-indoeuropeu, *h₃em-, *h₂eh₃m- , amargo. Seria a cor da bile antes de ficar esverdeada.
Verde
Uma das cores que vem diretamente do Latim viridem, viridis, verde. A forma verbal virieo conota a idea de brotar ou de ser verdejante. A raiz talvez seja o indoeuropeu *wiro- (homem forte, viril). Caso contrário, seria de origem desconhecida, pois outras raízes aparentam dar conta para a cor: *ghre- (de onde green, grow, grass) e *ghel- (latim helvus “hortaliça”, italiano flavo, grego chloros, gálbano – uma planta originária da Síria de cor entre verde e amarelo).
Roxo
Uma cor com vários tons e nomes que confundem. Roxo vem do latim russeaus, vermelho escuro, uma variante de russus, vermelho, vindo do distante proto-indoeuropeu *h₁rewdʰ-.
O roxo não aparece no espectro tradicional. O mais próximo dele é a cor violeta. Contrário à etimologia popular de que violeta era a flor plantada nas sepulturas das mulheres violadas, a menos trágica origem da cor vem do português arcaico viola, derivado do latim Vitula, deusa da alegria e da vitória.
Outro termo do português arcaico, o cardẽo, era usado para essa mesma cor, derivada do latim vulgar *cardinus, from Latin carduus, cardo designação de diversas espécies de plantas do gênero Cynara.
Ainda de origem florida temos o lilás, plural de lilá, que chegou ao português via o árabe lilak, vindo do persa nilak, originário do sânscrito nīlā, de onde veio nosso anil. Ainda há o latino purpura, também derivado de um molusco do qual se extraía a tintura que grego é porphyra.
Cinza
A cor vem dos restos da queimada, no latim vulgar *cinisĭa, correpondente ao latim clássico cinis, cineris, por sua vez, do proto-indoeuropeu *keni-, pó.
Outro nome, gris, vem do proto-germânico, *grēwaz, remontando do proto-indoeuropeu *gʰer-, brilhar.
Marrom
Marrom veio do francês marron ao português do Brasil, embora ocorra em outras línguas ibéricas. A origem francesa é controversa. Há quem diga que venha do radical pré-romano *marr-, pedra, devido à dureza do fruto da castanheira. Outros acham que veio do italiano marrone, que teria vindo do grego maraon, todos ligados à castanha. Já castanho provavelmente do latim castaneus, referente às nozes da castanheira.
Cor-de-rosa
Da flor, via latim rosa, possivelmente do grego rhódon e daí do proto-indoeuropeu from *wr̥dʰo.
Negro
Do latim niger, talvez originário do proto-indo-europeu *nókʷts, noite. Já preto teria vindo do latim pressus, “apertado, denso, comprimido”, de premere, “apertar, espremer”.
Saiba Mais
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Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa
Diccionario de la lengua española – Real Academia Española
WATKINS, Calvert. The American Heritage Dictionary of Indo-European Roots. Houghton Mifflin, 2000.