
Sem mencionar alguma data, segundo o Alcorão[1] Jesus, o Messias, nasceu milagrosamente da concepção virginal de Maria. Apesar do alto papel de Jesus nas crenças do islã, não é comum entre os muçulmanos comemorarem o 25 de dezembro como uma data especial. Entretanto, algumas tradições e grupos de muçulmanos consideram o Natal como significativo.
O Natal nem mesmo é uma questão tão importante no cristianismo. O Novo Testamento não menciona a data do nascimento de Jesus, inclusive na época era proibido entre os judeus comemorarem aniversários[2]. Uma das mais antigas especulações sobre a data do nascimento de Jesus — uma anotação do bispo egípcio Clemente em 192 d.C.— aponta as prováveis datas em novembro, abril, maio ou janeiro[3]. Sequer menciona dezembro. O Natal e a Epifania começaram a ser comemorados nas igrejas orientais no século IV, sendo 6 de janeiro a data maior (ainda para os armênios o Natal é comemorado nessa data, para os etíopes no dia 7 de janeiro). Fato é: um dia Jesus nasceu e muitos cristãos decidiram celebrar esse evento. A data é mera convenção. Outros cristãos, influenciados pelo puritanismo, abandonaram a comemoração do Natal como irrelevante (outros, com uma lógica não muito clara como se fosse uma data pagã). Mas, voltemos aos muçulmanos.
O islã é multiforme, com vários grupos, subdivisões, interpretações locais da religião.
Alguns países muçulmanos como Arábia Saudita, Brunei, Tadjiquistão e Somália proíbem o Natal e seus símbolos. Na maior parte dos países da Ummah a data é indiferente, obliterada com as comemorações do Eid Al-Fitr (fim do Ramadã) ou absorvida as celebrações secularizadas do Ocidente. Por essa última razão, alguns chatos anticolonialistas ou adeptos de versões puritanas do islã, principalmente do norte da África, consideram as tradições natalinas secularizadas — Papai Noel, árvore, dar presentes, ceia de Natal — como importações europeias a serem rejeitadas.
Para outras comunidades e países de maioria muçulmana a data é relevante. A religiosidade popular islâmica de comemorar o nascimento dos profetas, hoje condenada pela vertente salafi, inspirou várias tradições natalinas entre os muçulmanos, em geral influenciadas pelas igrejas orientais e distintas das tradições natalinas ocidentais.
Os tátaros lipka — a comunidade islâmica da Polônia, países bálticos e Finlândia – comemoram a data. Seu costume de enfeitar árvores de Natal antecede sua popularização pelo mundo.
Os alawitas da Síria e Líbano também comemoram o natal com ceias e até montam presépios com figurinhas de argila. É uma das principais festas familiares dessa comunidade.
Na Bósnia e Albânia o Natal é chamado de Mevlud Isa, o aniversário de Jesus. E é comemorado na data da epifania, em janeiro.
As decorações natalinas nas lojas e as figuras do Papai Noel abundam na República Islâmica do Irã, apesar de ter mais uma conotação secularizada como no Ocidente, como também ocorre em Bangladesh e na Turquia.
Em Belém, o Natal é a festa maior da cidade, envolvendo tanto cristãos e muçulmanos na praça onde estão a Mesquita de Omar e a Igreja da Natividade.
Não longe dali, na Jordânia, amigos cristãos e muçulmanos dividem a ceia juntos.
Antes dos conflitos dos anos 2000, o Natal era a data quando os muçulmanos visitavam as igrejas no Egito, Líbano e Iraque.
O maior país muçulmano do mundo, a Indonésia, tem suas próprias tradições islâmicas de comemorar o Natal, sendo uma das maiores festividades do país. Canções, luzes e uma multidão vestida de Papai Noel marcam a época. Em Java, a data coincide com o Kejawen, uma festividade local. Crianças ganham presentes e em algumas vilas matam animais para a ocasião. A pohon Natal, a típica árvore de Natal indonésia, é feita com plástico e papel.
A quem comemora a data, Eid Milad Majid!
[1] Sura 19:16-34.
[2] JOSEFO. Contra Apião II: 26. “E além disso, a lei não nos permite fazer festas nos aniversários de nossas crianças, e através disso se permitir ocasião de beber ao excesso; mas esta ordena que no mais imediato princípio de nossa educação devemos ser imediatamente dirigidos à sobriedade”.
[3] CLEMENTE DE ALEXANDRIA. Stromata I.21