Antagonímia: ou a semântica sendo irônica

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Depois da sanção da mulher, solícito, Zé colheu o milho-verde na charneca alugada. Do milho resultou uma broa fresquinha de queimar os beiços.

Falta um termo oficial na Nomenclatura Gramatical Brasileira para essa categoria de palavras cujo significado é diferente, senão o oposto, do que normalmente representa. Emprestando de termos gramaticais estrangeiros, poderíamos chamar as palavras autocontraditórias, retrônimo, enantiodrome, contrônimo, auto-antônimo, anfíbola ou outro neologismo feio. São poucos mas curiosos esses vocábulos que se contradizem no português:

  • Aparente é tanto o que parece ser ou o que finge ser.
  • Pão fresco não é fresco, é quente.
  • Charneca em Portugal é seca, no Brasil é um terreno úmido ou pantanoso.
  • Milho-verde não é verde, mas amarelo.
  • Sanção significa que é permitido ou punível?
  • Borracha, ao menos aquelas branquinhas escolares, não são para deixar borrado, mas limpo.
  • Solícito é quem é oferecido. O adjetivo serve tanto a intrometidos quanto a pessoas gentis.
  • Cabeleireiro unissex não serve um único sexo, mas a todos.
  • Aluguel é o ato de quem toma ou coloca algo para alugar?
  • Banqueta não é um banquinho baixo, mas os bancos altos de bar.
  • Hermenêutica remete a Hermes, o deus da comunicação, mas se esclarece, por que algo hermético é obscuro?
  • Imprecação é tanto implorar com veemência quanto rogar pragas.
  • Júbilo é uma alegria, a menos que tenha sido jubilado na faculdade.
  • Sofisticação é o ato de ocultar algo para enganar ou fraudar, mas pode ser mostrar um requinte ou finura.
  • Droga é tanto o que cura quanto o que danifica. Jacques Derrida notou que em grego antigo pharmakon era remédio e veneno.

A geografia e marketeiros imobiliários são fãs de antagônimos: a Terra do Fogo é o frio do cão, Groelândia (Terra Verde) é branca de neve, não se lavra nada na Península do Labrador, Puerto Rico não é lá tão rico, Rio de Janeiro não é um rio, tampouco o Rio Guaíba. E candidatos não são tão cândidos.

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