O termo metaplasmo designa as transformações fonéticas que as palavras sofrem ao longo de sua evolução histórica. Em outras palavras, trata-se das mudanças na forma como os sons são articulados e reorganizados ao longo do teempo. O estudo dos metaplasmos registra a história da língua, revelando como ela se transforma e se adapta às necessidades comunicativas dos falantes ao longo do tempo. Ao analisarmos essas mudanças, podemos traçar relações entre idiomas, identificar influências de diferentes culturas e entender a dinâmica interna da língua.

No caso da língua portuguesa, muitos metaplasmos ocorreram durante a transição do latim para o português. Essas transformações, embora complexas e variadas, seguem algumas tendências fonéticas gerais que nos ajudam a compreender os padrões de mudança. Frequentemente chamadas de leis fonéticas, é importante esclarecer que essas tendências não são regras fixas e imutáveis, mas sim princípios que orientam as mudanças fonéticas, sujeitos a variações e exceções.
Tendências Fonéticas na Evolução do Português
- Tendência à economia articulatória (“lei do menor esforço”): os falantes tendem a simplificar a pronúncia das palavras, buscando economia de energia articulatória. Isso pode levar à perda de sons, à simplificação de grupos consonantais e a outras mudanças que tornam a fala mais fluida e eficiente. Por exemplo, a palavra latina “calidus” evoluiu para “caldo” em português, com a queda da consoante intervocálica /d/.
- Tendência à preservação da consoante inicial: em muitos casos, a consoante inicial da palavra em latim se mantém na palavra em português. No entanto, essa tendência não é absoluta, e há casos em que a consoante inicial sofre alterações devido a fatores como a influência de outras línguas e processos fonéticos específicos.
- Tendência à manutenção da sílaba rônica: a sílaba tônica da palavra latina tende a ser preservada na palavra em português. Mas, assim como a tendência anterior, essa também apresenta exceções. A sílaba tônica pode mudar ao longo do tempo devido a fatores como a influência de outras línguas, a analogia com outras palavras e a dinâmica interna da língua.
Fonotática e metaplasmos
A fonotática é o conjunto de regras que governam como os sons podem ser combinados para formar sílabas e palavras dentro de uma língua. Basicamente, ela define quais sequências de sons são permitidas e quais são proibidas. Por exemplo, em português, a sequência /tr/ é permitida no início de uma sílaba (“trabalho”), mas /rt/ não é.
As restrições fonotáticas de uma língua influenciam diretamente os processos de metaplasmo. Isso ocorre porque o metaplasmo, seja por adição, supressão ou alteração de sons, sempre precisa resultar em formas que obedeçam às regras fonotáticas da língua.
Imagine, por exemplo, a palavra “pneu” em português. Se, hipoteticamente, ocorresse uma prótese (adição de um som no início da palavra) de /i/ no início da palavra, teríamos */ipneu/. Essa forma seria estranha e provavelmente rejeitada pelos falantes, pois viola as regras fonotáticas do português, que não permitem a adição à sequência /pn/ no início de sílabas. Em contrapartida, um metaplasmo como epêntese (adição no interior da sílaba) do /i/ em “pineu” (/pi.neu/) é aceitável, pois a sequência /p/ + /i/ é permitida. De modo diverso, falantes do português admitem prótese mas não epêntese quando pronunciam “school” em um contexto linguístico de fala de portuguesa: /is.kul/ e não /si.kul/.
A fonotática atua como uma espécie de “filtro” para os metaplasmos, garantindo que as mudanças sonoras resultem em palavras que soem naturais e aceitáveis dentro do sistema fonológico da língua.
Tabela de Metaplasmos
| Modo de Manifestação | Tipo de Metaplasmo | Descrição | Exemplos (Latim > Português) |
|---|---|---|---|
| I. Adição | Acréscimo de um fonema à palavra. | ||
| Prótese | Acréscimo no início da palavra. | stare > estar <br> spiritu > espírito | |
| Epêntese | Acréscimo no meio da palavra. | masto > mastro <br> stella > estrela | |
| Paragoge | Acréscimo no fim da palavra. | ante > antes | |
| II. Supressão | Perda de um fonema na palavra. | ||
| Aférese | Perda no início da palavra. | acume > cume <br> attonitu > tonto | |
| Síncope | Perda no meio da palavra. | legale > leal <br> malu > mau | |
| Haplologia | Perda de uma sílaba similar a outra na palavra. | idololatra > idólatra <br> bondadoso > bondoso | |
| Apócope | Perda no fim da palavra. | cinematógrafo > cinema > cine <br> mare > mar | |
| Crase | Fusão de duas vogais iguais. | videre > veer > ver <br> dolore > door > dor | |
| Sinalefa | Desaparecimento de vogal no fim da palavra quando a próxima começa com vogal. | de + este > deste | |
| III. Transposição | Mudança na posição de um fonema. | ||
| Metátese | Troca de posição de fonemas dentro da sílaba. | pro > por <br> semper > sempre | |
| Hipértese | Troca de posição de fonemas entre sílabas. | capio > caibo <br> primariu > primairo > primeiro | |
| Hiperbibasmo | Mudança na posição da sílaba tônica. | pântanu > pântano <br> campana > campa | |
| IV. Transformação | Mudança na natureza do fonema. | ||
| Sonorização | Troca de consoante surda por sonora. | lupu > lobo<br> cito > cedo <br> acutu > agudo | |
| Vocalização | Transformação de consoante em vogal. | octo > oito <br> multu > muito | |
| Consonantização | Transformação de vogal em consoante. | vagare > vagar <br> ieiunu > jejum | |
| Assimilação | Mudança para um fonema próximo. | palumba > paomba > pomba <br> persona > pessõa > pessoa | |
| Dissimilação | Desaparecimento de um fonema repetido ou similar. | temoroso > temeroso <br> memorare > nembrar > lembrar | |
| Nasalização | Fonema oral se torna nasal. | mihi > mi > mim <br> macula > macla > mancha | |
| Desnasalização | Fonema nasal se torna oral. | luna > lua <br> bona > bõa > boa | |
| Apofonia | Mudança no timbre da vogal por influência de um prefixo. | in + barba > imberbe | |
| Metafonia | Mudança no timbre da vogal por influência de outra vogal. | novum > novo <br> focum > fogo |

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