Na literatura egípcia, poucos contos ressoam tão profundamente quanto as aventuras de Sinuhe. A narrativa relata o hubris de um oficial egípcio que encontra refúgio em terras distantes e vive seu anseio de retornar à sua terra natal. Embora permaneçam lacunas na história, os fragmentos que sobreviveram oferecem um fascinante vislumbre da dinâmica cultural entre o Egito e o Oriente Próximo.

As aventuras de Sinué
Sinuhe, também grafado Sinué, é um mensageiro de confiança e assistente do reverenciado faraó Amenhotep I. Relata em primeira pessoa que ao retornar de uma expedição à Líbia se vê envolvido em um turbilhão de intrigas quando acidentalmente ouve a notícia do assassinato do monarca. Dominado pelo medo e pela incerteza, Sinuhe toma a decisão de fugir do Egito, buscando refúgio em Retenu Superior, região central do Levante onde hoje seria conhecido como Palestina, Líbano, Síria e Israel. Mal sabia ele que esse ato desencadearia uma série de aventuras que moldariam seu destino.
Na terra de seu exílio, Sinuhe prospera, conquistando um lugar para si como uma figura respeitada na comunidade local. Enfrenta um valentão e ganha respeito dos locais. Casa-se com a filha de um rei local. O exilado cria uma família, torna-se um líder e reprime rebeliões com sucesso. Participa de campanhas para captura de gado e de prisioneiros. No entanto, à medida que envelhece, a saudade bate. Apesar de suas realizações, uma inquietação persistente atormenta o coração de Sinuhe. Seu desejo pelo Egito fica cada vez mais forte a cada ano que passa.
O desejo de Sinuhe de retornar ao Egito, antes um sonho distante, se materializa inesperadamente. Uma carta chega com o selo do novo faraó, Sesóstris I, chamando-o de volta para sua terra natal. Com uma mistura de empolgação e cautela, Sinuhe atende ao chamado, deixando para trás sua nova família e tribo. Sua jornada o leva pela movimentada capital, onde o exilado encontra o próprio rei. Apesar de sua aparência esfarrapada e desgrenhada, algo chocante aos asseados e barbeados egípcios, o rei perdoa Sinuhe por sua fuga. Recebe o convite para se juntar à elite egípcia.
A estória de Sinuhe, embora fragmentado, foi preservado através de várias cópias que datam das 12ª e 13ª dinastias. Entre eles, o manuscrito Berlin 3022 se destaca como a fonte para traduções canônicas.
A história de Sinuhe é um exemplo de literatura migrante e do exílio. Foi popularizada pela tradução pelo egiptólogo Flinders Petrie e ganhou uma continuação no conto “O Retorno de Sinuhe” do escritor egípcio laureado ao Nobel Naguib Mahfouz. (A novela do finlandês Mika Waltari com protagonista homônimo não possui relações com o conto). Alguns paralelos bíblicos são notórios, como a fuga de Moisés para Midiã ou de Davi enfrentando o gigante Golias, ou sua redenção como José do Egito. O relato ambientado no reinado do faraó Sesóstris I, cujo reinado foi entre 1971 e 1926 a.C., continua cativante.

SAIBA MAIS
COS 1.38 – Sinuhe
ANET 18-22 – The Story of Si-nuhe
Flinders Petrie. The Adventures of Sanhet. Egyptian Tales, 1895.
Parkinson, Richard B. The Tale of Sinuhe and other ancient Egyptian poems, 1940-1640 BC. Oxford: Clarendon Press, 1997.

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