A contracultura hippie dos anos 1970 valorizava o artesanato, a recirculação de roupas e adereços; enfim, um estilo despojado anticonsumerista. Agora, o boho chic coopta a estética para produção industrial em facções de trabalho análogo ao escravo para que possa vender caro. A ironia faria o crítico social Horkheimer dar um sorrisinho com o ar de “eu avisei”.
Max Horkheimer (1895–1973) foi um filósofo e sociólogo alemão, uma das figuras centrais da Escola de Frankfurt e da teoria crítica. Sua obra examina criticamente a relação entre razão, poder e barbarismo, especialmente no contexto da modernidade, do capitalismo e do fascismo.
Razão e Barbarismo
Em suas obras tardias, Horkheimer desenvolveu uma crítica contundente à racionalidade moderna, especialmente a fundamentada no Iluminismo e suas consequências sociais e políticas. Na Dialética do Esclarecimento (1947) e no Eclipse da Razão (1947), ele e Adorno argumentam que a racionalidade iluminista, longe de promover a emancipação humana, contribuiu para novas formas de dominação e barbarismo.
Razão Instrumental e Razão Objetiva
Horkheimer distingue entre dois tipos de razão: a Razão Objetiva, que busca verdades universais e valores éticos, e a Razão Instrumental, que se reduz a cálculos de eficiência e controle. A modernidade teria substituído a primeira pela segunda, transformando o pensamento crítico em mero instrumento técnico.
Mito → Iluminismo → Novo Mito (por exemplo, ideologia fascista, ilusões consumistas).
A razão, em vez de superar a dominação, torna-se uma ferramenta para ela.
Essa transformação leva a três consequências principais:
- Dominação da Natureza: A exploração ambiental motivada pela racionalidade técnica.
- Dominação Humana: Estruturas sociais opressoras legitimadas pela lógica do progresso.
- Perda da Crítica Moral: A ética cede lugar à utilidade.
O Retorno da Barbárie
Para Horkheimer, o fascismo e a alienação capitalista são manifestações desse racionalismo distorcido. A barbárie não resulta de um colapso da razão, mas de sua instrumentalização. O Holocausto, por exemplo, não foi uma irracionalidade caótica, mas um processo burocrático e tecnicamente eficiente, fruto de uma racionalidade pervertida.
A cultura de massa também exemplifica essa regressão: a produção cultural padronizada e industrializada substitui o pensamento crítico por entretenimento superficial, promovendo a conformidade social.
A Crítica ao Iluminismo
Horkheimer e Adorno veem o projeto iluminista como paradoxal: o mito é superado pela razão apenas para retornar sob novas formas, como ideologias fascistas ou ilusões consumistas. A razão que pretendia libertar torna-se ferramenta de opressão.
O Eclipse da Razão
Em suas últimas reflexões, Horkheimer alerta que, desprovida de objetivos éticos, a razão se torna cúmplice do poder. Em vez de promover a liberdade, legitima o autoritarismo, a conformidade social e o niilismo, ao esvaziar o sentido da existência humana.
Consideração: A Razão Pode Ser Redimida?
Horkheimer não rejeita a razão, mas defende uma postura crítica que reconecte o pensamento com objetivos emancipatórios. Para ele, a única saída é restaurar uma razão reflexiva e ética que questione toda forma de dominação. Sua obra continua relevante para compreender como crises contemporâneas — fascismo, capitalismo e catástrofes ambientais — resultam não da irracionalidade, mas de uma racionalidade corrompida.

Horkheimer: vida
Nascido em em Stuttgart, Alemanha, Horkheimer veio de uma família judaica abastada, cujo pai era industrial. Inicialmente trabalhando na fábrica da família, abandonou essa trajetória para estudar filosofia e psicologia. Sob influência de Marx, Schopenhauer, Kant e Hegel, formou-se doutor em 1922, sob orientação de Hans Cornelius.
Nos anos 1920 e 1930, Horkheimer consolidou sua carreira acadêmica ao ingressar no Instituto de Pesquisa Social (Escola de Frankfurt) em 1925, do qual se tornaria diretor em 1930. Sob sua liderança, o instituto se afastou do marxismo ortodoxo, desenvolvendo a teoria crítica — uma abordagem que integrava filosofia, sociologia e psicanálise para investigar as estruturas de dominação na sociedade moderna.
Com a ascensão do nazismo, Horkheimer deixou a Alemanha em 1933, exilando-se com a Escola de Frankfurt em Genebra, Paris e, finalmente, Nova York, onde se estabeleceu na Universidade de Columbia. Durante a Segunda Guerra Mundial, desenvolveu análises sobre o fascismo e a cultura de massa.
Após a guerra, Horkheimer retornou à Alemanha em 1949 e retomou seu trabalho na Escola de Frankfurt, assumindo também a reitoria da Universidade de Frankfurt (1951–1953). Nos anos finais, tornou-se mais cético quanto às possibilidades de emancipação moderna, mas manteve sua influência intelectual até sua morte em 7 de julho de 1973, em Nuremberg.
SAIBA MAIS
Horkheimer, Max. Eclipse of Reason. New York: Oxford University Press, 1947.
Horkheimer, Max. Critical Theory: Selected Essays. Translated by Matthew J. O’Connell et al. New York: Continuum, 1972.
Horkheimer, Max. Between Philosophy and Social Science: Selected Early Writings. Translated by G. Frederick Hunter, Matthew S. Kramer, and John Torpey. Cambridge, MA: MIT Press, 1993.
Horkheimer, Max. Dawn & Decline: Notes 1926–1931 and 1950–1969. Translated by Michael Shaw. New York: Seabury Press, 1978.
Horkheimer, Max; Theodor W. Adorno. Dialectic of Enlightenment: Philosophical Fragments. Edição de Gunzelin Schmid Noerr. Tradução de Edmund Jephcott. Stanford, CA: Stanford University Press, 2002. (Original de 1947 com Dialektik der Aufklärung.)
Horkheimer, Max. The Authoritarian State. New York: Continuum, 1982.
Horkheimer, Max. A Life in Letters: Selected Correspondence. Edited and translated by Manfred R. Jacobson and Evelyn M. Jacobson. Lincoln: University of Nebraska Press, 2007.
Horkheimer, Max. Gesammelte Schriften [Collected Writings]. 19 vols. Edited by Alfred Schmidt and Gunzelin Schmid Noerr. Frankfurt: S. Fischer, 1985–1996.
Abromeit, John. Max Horkheimer and the Foundations of the Frankfurt School. Cambridge: Cambridge University Press, 2011.
Benhabib, Seyla. Critique, Norm, and Utopia: A Study of the Foundations of Critical Theory. New York: Columbia University Press, 1986.
Jay, Martin. The Dialectical Imagination: A History of the Frankfurt School and the Institute of Social Research, 1923–1950. 2nd ed. Berkeley: University of California Press, 1996.
Wiggershaus, Rolf. The Frankfurt School: Its History, Theories, and Political Significance. Translated by Michael Robertson. Cambridge, MA: MIT Press, 1994.

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