Friedrich Engels, pensador, ativista e teórico alemão, elaborou conceitos do materialismo histórico e da teoria socialista. Embora frequentemente associado a Karl Marx como seu colaborador mais próximo e amigo de longa data, Engels produziu uma obra própria significativa, aplicando a análise materialista a uma ampla variedade de fenômenos sociais, históricos e políticos, como evidenciado em trabalhos como A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado (1884) e As Guerras Camponesas na Alemanha (1850).
Ideias Centrais
A contribuição de Engels para o pensamento marxista abrange diversas áreas, interligadas pela perspectiva do materialismo histórico e da luta de classes.
- Evolução Social e Materialismo Histórico: Influenciado pela antropologia de seu tempo, notadamente por Lewis H. Morgan, Engels defendeu uma visão da evolução social em estágios, partindo de um comunismo primitivo para sociedades baseadas em classes. Ele vinculou esse desenvolvimento às condições materiais, principalmente às transformações nos modos de produção e nas relações de propriedade. A emergência da propriedade privada sobre os meios de produção foi vista como o fator crucial que levou ao surgimento das divisões de classe, do Estado como instrumento de dominação de classe, e de novas estruturas familiares, como a patriarcal.
- A Origem da Família e a Opressão da Mulher: Em A Origem da Família…, Engels apresentou uma análise pioneira e influente sobre a opressão da mulher, conectando-a diretamente ao desenvolvimento da propriedade privada e da sociedade de classes. Ele argumentou que a família nuclear monogâmica não era uma instituição natural e eterna, mas um produto histórico surgido com a necessidade de garantir a herança da propriedade privada através de herdeiros masculinos legítimos. Essa transição marcou a “derrota histórica mundial do sexo feminino”, substituindo sociedades possivelmente matrilineares pelo controle patriarcal sobre a propriedade e a reprodução. Engels sustentava que o capitalismo reforçava a subjugação feminina, confinando as mulheres ao trabalho doméstico não remunerado e excluindo-as em grande parte da produção social. A verdadeira libertação feminina, para ele, só seria possível com a abolição da propriedade privada e a plena integração das mulheres no trabalho socializado sob o socialismo.
- Análise Materialista da Religião: Engels via a religião fundamentalmente como um reflexo das condições materiais de existência e das relações sociais. Em sociedades de classe, ela frequentemente serviria para justificar a exploração e a ordem social vigente. Contudo, ele também reconhecia que formas primitivas de religião e movimentos religiosos populares (como o cristianismo primitivo ou certas seitas durante a Reforma) poderiam ser expressões das classes oprimidas, canalizando seu descontentamento e, por vezes, inspirando a revolta. No entanto, a religião institucionalizada (como a Igreja estabelecida) tenderia a funcionar como uma ferramenta ideológica da classe dominante, promovendo a passividade e a aceitação da exploração.
- Religiões Populares e Revolta (Guerras Camponesas): Em As Guerras Camponesas na Alemanha, Engels analisou detalhadamente como movimentos religiosos durante a Reforma Protestante, como o liderado por Thomas Müntzer, tornaram-se veículos para a luta de classes dos camponeses contra a opressão feudal. As revoltas camponesas utilizaram uma retórica religiosa para articular suas demandas sociais e desafiar a ordem estabelecida, demonstrando como a religião poderia assumir um papel revolucionário quando alinhada aos interesses de grupos oprimidos. Ainda assim, Engels previa que, com a superação das condições materiais de alienação e exploração sob o socialismo, a religião enquanto necessidade social tenderia a desaparecer.
- Revolta e Revolução: A luta de classes é vista por Engels como o motor fundamental da mudança histórica, conduzindo, em última instância, à revolução proletária. Revoltas anteriores, como as Guerras Camponesas, foram interpretadas como importantes, porém prematuras e malsucedidas lutas de classe, devido à ausência de uma consciência proletária desenvolvida e de condições materiais maduras. Uma revolução socialista bem-sucedida exigiria a ação organizada da classe trabalhadora moderna para derrubar o capitalismo e estabelecer uma sociedade sem classes.
Vida
Friedrich Engels nasceu em 28 de novembro de 1820, em Barmen, na Prússia Renana (atual Wuppertal, Alemanha), filho de um próspero industrial têxtil. Sua família era ativa nos círculos protestantes avivados da região. Apesar de sua origem burguesa, Engels desenvolveu cedo uma crítica radical à sociedade capitalista, em parte devido à sua experiência direta com as brutais condições de vida da classe trabalhadora enquanto gerenciava negócios da família em Manchester, Inglaterra. Essa experiência resultou em sua primeira grande obra, A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra (1845).
Em 1844, iniciou sua colaboração intelectual e amizade vitalícia com Karl Marx. Juntos, desenvolveram as bases do materialismo histórico e dialético e escreveram obras fundamentais como A Sagrada Família, A Ideologia Alemã e, mais notavelmente, O Manifesto do Partido Comunista (1848). Engels não apenas contribuiu intelectualmente, mas também proveu suporte financeiro essencial para Marx e sua família durante décadas.
Após a morte de Marx em 1883, Engels dedicou-se a editar e publicar os volumes II e III de O Capital, a partir dos manuscritos deixados por Marx, além de continuar a escrever e a sistematizar o pensamento marxista em obras como Anti-Dühring e A Origem da Família…. Friedrich Engels faleceu em Londres em 5 de agosto de 1895.
Legado
O legado de Friedrich Engels é inseparável do marxismo, mas sua contribuição individual deixou suas marcas. Ele aplicou e expandiu a análise materialista histórica para compreender a evolução das sociedades, a estrutura da família, a opressão de gênero e o papel da religião e da ideologia. Sua obra A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado tornou-se um texto fundador para o feminismo socialista e marxista.
Engels desempenhou um papel vital na organização do movimento operário internacional e na sistematização e divulgação das ideias marxistas após a morte de Marx. Sua análise conecta de forma coesa evolução social, estruturas familiares, opressão feminina e religião à história materialista e à luta de classes, vendo o socialismo como o caminho para desmantelar instituições opressoras e emancipar a humanidade. Seu trabalho permanece fundamental no pensamento materialista histórico e na crítica social.
SAIBA MAIS
- ENGELS, Friedrich. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. (Original: Der Ursprung der Familie, des Privateigenthums und des Staats, 1884).
- ENGELS, Friedrich. As Guerras Camponesas na Alemanha. (Original: Der deutsche Bauernkrieg, 1850).
- ENGELS, Friedrich. A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra. (Original: Die Lage der arbeitenden Klasse in England, 1845).
- ENGELS, Friedrich. Anti-Dühring (O Senhor Eugen Dühring Revoluciona a Ciência). (Original: Herrn Eugen Dührings Umwälzung der Wissenschaft, 1878).
- ENGELS, Friedrich. Do Socialismo Utópico ao Socialismo Científico. (Original: Die Entwicklung des Sozialismus von der Utopie zur Wissenschaft, 1880).
- MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O Manifesto do Partido Comunista. (Original: Manifest der Kommunistischen Partei, 1848).

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